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Impossibilidade de transferência de penhora após extinção por pagamento

O recente julgamento do Recurso Especial nº 2.128.507/TO, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), firmou um importante precedente ao reconhecer a impossibilidade jurídica de transferência de penhora para outra execução fiscal autônoma após a extinção do processo em razão do pagamento. A decisão, de caráter inédito, traz repercussões significativas para o contencioso tributário, sobretudo nas esferas estadual e municipal.

O caso teve origem em uma execução fiscal proposta pelo Estado do Tocantins contra uma empresa do setor de telecomunicações, visando à cobrança de ICMS. Após a citação e a inércia da executada, houve penhora on-line integral dos valores devidos. Posteriormente, a empresa aderiu ao Programa de Recuperação de Créditos Tributários (Refis), quitando o débito e requerendo a liberação dos valores bloqueados.

Antes que o pedido fosse apreciado, o Fisco estadual solicitou a transferência da penhora, já convertida em depósito judicial, para outra execução fiscal em curso contra o mesmo contribuinte. Embora o juízo de primeiro grau tenha extinguido a execução pelo pagamento, acolheu o pedido fazendário e determinou o aproveitamento da garantia.

A empresa recorreu, e o Tribunal de Justiça do Tocantins deu provimento à apelação, determinando o levantamento da penhora em favor da executada. O Estado interpôs então Recurso Especial ao STJ, que foi desprovido pela Primeira Turma, consolidando entendimento de que não há amparo legal para a transferência de penhora após a extinção da execução fiscal.

O STJ iniciou sua análise afastando a alegação de violação aos artigos 789 e 860 do Código de Processo Civil (CPC). O artigo 860, que trata da “penhora no rosto dos autos”, é aplicável apenas a execuções entre particulares, nas quais o devedor tem crédito contra terceiro. Tal mecanismo não se confunde com a execução fiscal, cujo objeto é o crédito público. Já o artigo 789 limita-se a definir a responsabilidade patrimonial do devedor, o que, no caso concreto, não estava em discussão.

A controvérsia, portanto, não dizia respeito à responsabilidade pelo débito, mas à possibilidade de aproveitar uma penhora realizada em processo já extinto para garantir outra execução fiscal.

Com base na Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), a Corte destacou que o artigo 28 permite a reunião de execuções conexas, de forma facultativa e mediante requerimento das partes, desde que haja identidade de sujeitos, competência do mesmo juízo e fases processuais compatíveis. No caso concreto, os processos tramitavam de forma autônoma, e não houve pedido formal de reunião. Assim, não havia respaldo legal para a transferência da penhora.

O STJ também ressaltou que a LEF não prevê o aproveitamento da garantia após a extinção do processo, mas apenas sua devolução ao depositante em caso de êxito ou conversão em pagamento definitivo quando o contribuinte é vencido. Além disso, a Corte afastou a aplicação, por analogia, do artigo 53, §2º, da Lei nº 8.212/1991, que autoriza a transferência de garantias em execuções da União, por se tratar de norma restrita à esfera federal. Aplicá-la a estados e municípios violaria o princípio da separação de Poderes, configurando indevida atuação judicial como legislador positivo.

Dessa forma, o STJ concluiu que não há fundamento no CPC nem na LEF que autorize o reaproveitamento de penhora em dinheiro após o encerramento de execução fiscal autônoma. Nessas hipóteses, o depósito judicial deve ser restituído ao contribuinte que quitou o crédito tributário, em observância ao artigo 32, §2º, da LEF.

O entendimento preserva o princípio da legalidade estrita e impede a perpetuação de constrições patrimoniais sem finalidade, fortalecendo as garantias do contribuinte frente ao poder de cobrança do Estado.

A decisão da Primeira Turma do STJ reafirma o caráter especial da Lei de Execuções Fiscais e delimita os poderes do magistrado diante da atuação fazendária. Ao vedar o reaproveitamento de penhoras relativas a créditos já extintos, o Tribunal protege a segurança jurídica e reforça o equilíbrio entre efetividade da cobrança fiscal e os direitos do contribuinte.

Esse precedente deve servir de referência para futuras decisões nas execuções fiscais estaduais e municipais, consolidando o entendimento de que, uma vez extinta a execução pelo pagamento, a garantia deve ser devolvida ao contribuinte. Trata-se de um avanço relevante na proteção da propriedade, no respeito à legalidade e na busca por um contencioso tributário mais equilibrado e previsível.

Por Janssen Murayama

Fonte: Jota
Foto: Canva

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